terça-feira, 28 de abril de 2009

PAUSA PARA MEDITAÇÃO

Não é falta de idéia e nem de tempo (pois cada um administra o seu tempo). Tenho vários temas para tratar e provocações a fazer. No entanto, temo não estar usando as ferramentas adequadas e, por isso, muito está se perdendo. Estou fazendo uma revisão nos procedimentos e, em breve, volto à produção. Mesmo porque a Biblioteconomia da ECA entrou em fase de auto-reflexão, auto-percepção, auto-avaliação e perspectivas de mudanças. 

quarta-feira, 22 de abril de 2009

A BIBLIOTECONOMIA E AS OUTRAS

Meu projeto de escrever uma série de textos reflexivos sobre a crise em que nos metemos, face a outras demandas, caducou. Não há vaca e nem brejo, mas a vaca está indo para o brejo. E as pessoas estão inquietas. Fiz dias atrás, aqui mesmo, uma pergunta picante: o aluno de biblioteconomia aprende a ser diferente na sala de aula ou antes de optar pela biblioteconomia já era diferente? Em outras palavras: a questão é de ambiente escolar ou de personalidade? Eu não sei responder. Mas pelos anos de magistério observo que o ambiente da biblioteconomia reforça a personalidade da maioria; a minoria, com outra personalidade, rebela-se. Em turmas de biblioteconomia posso, rapidamente, aplicar o título de uma famosa obra de Umberto Eco: Apocalípticos e Integrados. Na sequência do raciocínio, vejo e escuto e concluo: a maioria é integrada. Mas há uma parte de apocalípticos que vive inconformada, vira a mesa e desiste. Seria bom que alguém tivesse a paciência e a coragem de calcular o índice de evasão nos cursos de biblioteconomia. Aqui na USP, por dados oficiais, é alto. Por que isso acontece se a Universidade é gratuita e a carreira “promissora”? Creio que a maior parte dos evadidos são os apocalípticos. É uma pena, pois são exatamente esses que mantêm a chama do debate acessa e que seriam, usando a expressão bíblica, o “sal da terra” da profissão.

Quais seriam as características básicas dos integrados? Primeiramente, regozijam-se com disciplinas “práticas”, essas que ensinam “como fazer”. Rejeitam e sofrem com disciplinas mais teóricas, pois elas não vão servir para nada na vida real, são inúteis. Anos atrás estava “dando aula” (raramente faço isso) e, nessas horas, tenho voos livres, estratosféricos. De repente, uma aluna me puxou para o vil e áspero chão e me perguntou: “isso cai em concurso?” Por uns segundos fiquei catatônico e disse: “não, não cai em concurso, cai na vida”. É que, de um modo geral, os ensinam "o fazer" e, dificilmente, "o pensar". Em termos mais crus: formam para concursos e não formam para a vida e as suas circunstâncias.

Outras diferenças poderão ser vistas posteriormente. Mas fica uma pergunta final: entre apocalípticos e integrados como podem ser divididos alunos de outras áreas profissionalizantes? Em jornalismo, por exemplo, como é o panorama?

quinta-feira, 16 de abril de 2009

PIAGET & DEWEY 2

Um "anônimo", com razão, apontou um erro meu no neste parágrafo do post Piaget e Dewey: 

A Biblioteconomia secular não prepara pessoas para trabalhar com esse público complexo [os escolares]. E muito menos se preocupam com ele as instituições que buscam formar “cientistas da informação”. Para os primeiros diria que trabalhar com o público infanto-juvenil pede menos vale Dewey e mais pesa Piaget. Para os segundos, não sei o que esperar, talvez um Paulo Freire temperado com epistemologia?Para os primeiros diria que trabalhar com o público infanto-juvenil pede menos vale Dewey e mais pesa Piaget. Para os segundos, não sei o que esperar, talvez um Paulo Freire temperado com epistemologia?

O erro na terceira frase permite retornar ao assunto. Antes, corrijo: "Para os primeiros diria que trabalhar com o público infanto-juvenil pede menos Dewey e mais pesa Piaget." A frase, se lida com atenção, sugere vários desdobramentos e vai desaguar num dos mais complicados problemas de nossa área: a formação profissional. "Dewey", no caso, expressa a tremenda carga tecnicista tradicional. E há os novos tecnicistas (assunto prá logo mais). Com "Piaget"  sinalizei para a necessidade de olhar e entender os que fazem uso dos serviços que oferecemos. Piaget passou a vida estudando crianças e mudou o modo de vê-las.  Se o informador/comunicador não conhecer muito bem o seu público criança/escolar... certamente não vai fazer um bom trabalho. 

No entanto, no último desdobramento da frase, está clara a idéia mais forte: a necessidade de mudanças fortes na área. O informador que se dedica a escolares deve cursar parte dos quatros anos na Faculdade de Educação. E os que já se formaram em Educação fariam mais dois anos nas faculdades de comunicação/informação. Aliás, essa sugestão me custou uma denúncia ao Conselho de Biblioteconomia por quebra da ética profissional.  

E podemos, ainda, imaginar um outro e mais explosivo sentido oculto: No momento em que Informação se espalha por várias áreas do conhecimento ela só fica clara se vier acompanhada de algum outro termo: Informação Administrativa, Informação para Negócios, Informação Pública e, também, Informação para Educação. A frase do Piaget versus Dewey é uma típica "fácil falsa". 

O PERFIL DOS ALUNOS

Edilson fez um comentário no post "Informação Pública: que bicho e esse?" onde menciona a falta da dimensão política no profissional da informação. Esse é um assunto, para mim, muito intrigante. Não sei o motivo, mas os profissionais da antiga Biblioteconomia raramente se meteram em questões políticas. Na ECA eu ministrava uma das disciplinas para todas as áreas, além da Biblioteconomia: Jornalismo, Artes Cênicas, Relações Públicas, Cinema, etc. Os alunos de Biblioteconomia sentavam-se juntos e, pelas características, eu denominava o grupo de "a minha ilha do silêncio". O fenômeno repetia-se ano a ano. E de tal forma que eu cheguei a uma conclusão: não era a Biblioteconomia que moldava a cabeça dos alunos, mas as cabeças já moldadas é que escolhiam a Biblioteconomia. Curiosamente, os jovens que que queriam ser jornalistas eram bem diferenciados dos alunos que desejavam ser bibliotecários, ainda que ambos escolhessem, de forma variada, trabalhar com informação. Na realidade, os alunos da Biblioteconomia optavam por UMA imagem da profissão (a rotina silenciosa, o convívio com os livros, a visibilidade social limitada...) e não pelo perfil real de um agente/gestor/ator da informação. Será que o perfil dos nossos alunos mudou? Me vem à lembrança o Machado de Assis do Soneto de Natal:
"E, em vão lutando contra o metro adverso,
Só lhe saiu este pequeno verso:
"Mudaria o Natal ou mudei eu?"

terça-feira, 14 de abril de 2009

ARQUIVOLOGISTA: PAPEL EM CRISE

Não conheço detalhadamente os currículos dos cursos de Arquivologia (ou Arquivística como dizem alguns) existentes nas universidades brasileiras. Pelo que consta ela é irmã da Biblioteconomia e da Museologia e podem aparecer juntas sob a sombrinha da “Ciência da Informação”. No entanto, como a “Ciência” está no singular, não creio que elas integrem como uma ciência particular ou façam parte de ciência maior, mesmo não sendo uma ciência. Belo imbroglio, como dizem os italianos.

A apresentação do Curso de Arquivologia da UnB que, suponho, seja um dos mais atualizados, no seu primeiro parágrafo, dá o cenário onde atuará o arquivologista (ou arquivista?):

"Pilhas de documentos encostados no canto de uma sala, milhares de informações importantes perdidas em papéis sem qualquer identificação. A cena é recorrente em vários órgãos públicos e em empresas privadas que, na maioria das vezes, não dão o valor necessário aos documentos que contam sua história. Certidões, comprovantes e relatórios, que podem fazer a diferença na vida de várias pessoas, são deixados de lado por falta de organização."

Essa visão do inferno todos nós conhecemos. Há um acúmulo de desorganização, onde não apenas pouco se encontra como tudo está sob ameaça permanente de se perder de vez. E faltam pessoas e recursos para ordenar esse caos.

Ao lado disso, temos visto em setores administrativos esforços claros no sentido de NÃO mais produzir toneladas de papel. Em algumas organizações mais atualizadas, o que a legislação permite, já é digital e circula pela internet. Aos poucos essa migração será acelerada e. dentro de um tempo que não se pode prever, carimbos, assinaturas e tramitação tortuosa deixarão de existir. Pelo que percebo, estamos nesse processo de mudança há algum tempo e é irreversível.

Creio que é sob essa luz que a Arquivologia – que eu preferiria chamar de Informação Administrativa – deve ser vista. Em outras palavras: a preocupação é, não apenas, informatizar o remanescente desorganizado, mas criar as novas formas e plataformas de circulação de documentos administrativos. E aí vem a pergunta: esse profissional não deveria ser a integração do administrador com o analista de sistema?

Outra pergunta: no futuro, que já é presente, sendo criadas grandes organizações informatizadas (por exemplo, a administração federal) o ordenamento não será pré-estabelecido e o administrador, simplesmente, não digitará algumas teclas para localizar ou arquivar?

Se hoje há um caos de papéis e traças que um batalhão terá dificuldade para desinfetar e ordenar, amanhã esse batalhão deverá ter novas funções no campo da organização de sistemas. O prognóstico – que serve para a vasta e velha Biblioteconomia – é que essas novas funções serão desempenhadas por outros profissionais e a Arquivologia, este filme nós já vimos, poderá perder espaço para engenheiros de sistemas digitais, especialistas em banco de dados e conexos. E quem dialogará com esses engenheiros serão os administradores. Mais uma vez ficamos num meio de campo meio embaçado e confusos com a síndrome de terceiro escalão.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

KINDLE: QUE COISA É ESSA?

De um modo geral os serviços bibliotecários brasileiros, principalmente aqueles dirigidos a público vasto e diversificado estão distantes dos melhores exemplos produzidos por países mais desenvolvidos. E, frequentemente, vem a pergunta: por que paramos e não evoluímos? As explicações são vastas e podem ser dadas por historiadores, sociólogos, economistas e até por bibliotecários. No entanto, entendo que as explicações ajudam, apenas, a não repetir erros – o que já é um grande benefício. Mas não resolvem a situação. Lembro-me de Fernando Pessoa:

A criança que fui chora na estrada.
Deixei-a ali quando vim ser quem sou;
Mas hoje, vendo que o que sou é nada,
Quero ir buscar quem fui onde ficou.

Não dá para retroceder 50 anos e retomar a evolução das bibliotecas que estagnaram no modelo do INL. Esse tempo é irrecuperável. Sei que existem propostas para a construção no Brasil de uma biblioteca que existia nos anos 50 nos Estados Unidos. É como se fôssemos ao passado para retomar a evolução passo a passo. Todos nós sabemos que o Brasil passou do analfabetismo para as redes de televisão, ao contrário da Europa que teve 400 anos de cultura letrada. O mesmo salto ocorrerá no campo da informação pública. Em outras palavras, em algum momento pularemos das precárias bibliotecas para as novas propostas que se esboçam. O livro impresso sobre papel morreu? Não, mas seguindo os indicadores atuais isso poderá ocorrer. Por muito tempo eles serão adquiridos pelas bibliotecas públicas e escolares. Mas será que não poderíamos incluir um Kindle no ambiente público prá ver o que acontece?

A propósito, transcrevo um artigo publicado na Folha de S. Paulo de 7 de abril. Acho fundamental ouvir a opinião dos que transitam por estas páginas que, por sinal não são de papel.

Depois do iPod no som, o Kindle no texto
ELIO GASPARI
Há 6.000 anos os textos eram lidos em tabuletas e agora apareceu uma que armazena 1.500 livros
Saiu nos Estados Unidos uma engenhoca que fará a alegria de quem quer atravessar a fronteira dos meios de comunicação impressos, como livros, jornais e revistas. Chama-se Kindle e está na sua segunda versão. É uma tabuleta do tamanho de uma caixa de charutos e a espessura de um lápis, com uma tela pouco menor que um cartão postal. Custa US$ 359 e permite uma leitura confortável. Armazena até 1.500 livros, documentos e correspondência eletrônica. Assim como o iPod fixou um padrão para a música, o Kindle indica o futuro da recepção de textos e imagens sem a necessidade de se estar conectado a um computador.
O Kindle e os próximos produtos do gênero serão o complemento eletrônico dos impressos em papel. O jornal e o livro continuarão por aí, mas parte de sua freguesia migrará para o armazenamento eletrônico. Só um excêntrico lerá seu jornal na tabuleta enquanto toma café da manhã, mas será muito mais prático usá-la num avião, ou numa sala de espera. Por US$ 42 pode-se receber o "New York Times" na tabuleta, contra US$ 150 na banca ou US$ 64 na assinatura durante três meses. Isso tudo só nos Estados Unidos, pois o equipamento funciona dentro de uma rede sem fio que ainda não tem data para chegar a Pindorama.
Se nos próximos anos o Kindle evoluir com a versatilidade do iPod, pode-se esperar que terá uma tela maior, dobrável, receberá imagens a cores e multiplicará sua capacidade de armazenamento, custando a metade do preço de hoje.
O Kindle facilitou e barateou o acesso ao mundo editorial americano. Imagine-se o caso do livro "The Lost City of Z" ("A Cidade Perdida de Z"), que conta a história do coronel inglês Percy Fawcett, desaparecido em 1924, enquanto procurava na Amazônia a cidade perdida de uma civilização extinta. Faz cinco semanas que ele está na lista de mais vendidos do "New York Times".
Uma edição brasileira poderá demorar um ano para chegar às livrarias. Quem quiser comprá-lo (em inglês) pelo supermercado eletrônico da Amazon pagará US$ 16,50 pelo volume e US$ 10 pelo frete, para uma espera de até um mês. Se tiver pressa, o correio sobe para US$ 37, para uma entrega prometida em seis dias úteis.
Com o Kindle, o freguês conecta a tabuleta ao seu computador e, em dois minutos, baixa as 339 páginas da "Cidade Perdida", por apenas US$ 10. A engenhoca aceita anotações, sublinha trechos, acha qualquer palavra e dobra o canto da página.
Agora a má notícia: para que um brasileiro possa operar o Kindle, deverá ter uma conta na Amazon associada a um endereço físico nos Estados Unidos e um cartão de crédito americano. Com algum trabalho e a boa vontade de um amigo, é possível contornar o obstáculo. A melhor explicação possível para essa gambiarra está no blog de Antonio Carlos Silveira, sob o título "Amazon Kindle, como usar no Brasil".
Para que o Kindle possa ser considerado uma tecnologia vencedora, será preciso esperar um sinal do professor Delfim Netto, que tem a maior e melhor biblioteca particular privada do Brasil (270 mil títulos). Em Nova York, quando ele vai à livraria Strand, faz-se acompanhar por uma van. Freguês compulsivo do supermercado da Amazon, no dia em que ele ligar a tabuleta terá conquistado o mundo.

ALGUÉM PODE ME DIZER QUAL É A DIFERENÇA ENTRE INFORMAR E COMUNICAR?

O Curso de “Biblioteconomia e Documentação” da USP está dentro de uma Unidade denominada Escola de Comunicações e Artes. Como essa “Biblioteconomia” não é Artes Plásticas, Artes Cênicas ou Música, só pode ser Comunicação. Disso resultou uma dúvida generalizada: o “bibliotecário” é um comunicador? A tendência inicial é dar uma resposta positiva, uma vez que ele atende a um determinado público e se relaciona com esse público e, portanto, se comunica com esse público. Na prática, como isso se dá? Uma biblioteca bem organizada deve dispor de instrumentos que, normalmente, estão no âmbito do que se denomina “comunicação organizacional”, visando produzir mensagens com o uso de todos os meios para estabelecer a imagem que se deseja para os serviços oferecidos. Mas isso não indica que o “bibliotecário” possa ser caracterizado como comunicador. Se assim fosse, quaisquer profissionais seria, pois todos procuram ter uma boa imagem junto ao seu público. A pergunta feita era um pouco mais complicada: esse profissional é um informador ou um comunicador? Aí está o nó, pois é preciso distinguir com precisão o que é informação e o que é comunicação.

Li esta frase de autoria de George Gilder (?) e a dúvida aumentou: “Passaremos do século da Informação para o século da Comunicação. A primeira está em quem transmite. A segunda está em quem recebe.” Tenho algumas idéias sobre isso, mas não é pertinente trazê-las aqui. Vou dar uma volta bem ampla e tocar numa nova modalidade de serviço – ainda um objeto não claramente identificado: o “museu virtual”. Aliás, não dizem que a Biblioteconomia, Museologia e Arquivologia são irmãs? E filhas de quem? Da “Ciência da Informação”?

Em São Paulo temos dois conhecidos museus virtuais: o da Língua Portuguesa e o do Futebol. Foi inaugurado, recentemente, outro, uma espécie de museu da ciência, aqui denominado Catavento, que também usa recursos da computação. Podemos fazer alguns exercícios mentais, engendrando um “Museu Virtual da Comunicação”. Nesse museu um segmento, certamente, seria Gutenberg e a Imprensa. Num determinado ambiente o usuário poderia ver em três dimensões os tipos móveis e a prensa primitiva. Eventualmente, teria interesse em ver a famosa Bíblia e folheá-la. Isso seria feito por meio do Kindle que traria à mão (veja o próximo post). E mais, se fosse de seu desejo teria acesso à bibliografia do século XVI por autor, assunto, data de edição... Posso voltar ao ambiente três dimensões e ver bibliotecas desse século... e assim num desdobramento infinito teria alcance à informação apresentada sensorialmente, bem como navegaria pelos registros digitalizados. Em outras palavras, num mesmo serviço e ambiente poderia juntar o museu virtual com a biblioteca digitalizada.

Isso não é delírio e nem profetismo: é possível e com preços progressivamente menores. E vem a pergunta fatal: quem criaria serviços como esses? O comunicador ou o informador? Ou será que tudo isso não se funde num único profissional com outras práticas e outra visão de mundo?

terça-feira, 7 de abril de 2009

INFORMAÇÃO PÚBLICA? QUE BICHO É ESSE?

Se a “biblioteca escolar” deveria ser a prioridade primeira num projeto amplo de desenvolvimento social – e não é, e está relegada até pelos profissionais da informação – a “biblioteca pública”, doravante denominada “informação pública”, não fica atrás, pois o seu público é bem maior. Muitas vezes me pergunto por que a informação pública sumiu da preocupação dos bibliotecários. Potencialmente, é um trabalho fascinante pelos diversos desafios que encerra e pela competência e diversidade de conhecimentos que exige do profissional. Mas esse campo foi, praticamente, abandonado e entregue, de vez, a funcionários municipais sem nenhum preparo prévio. Quando existe, é a biblioteca municipal, quase sempre, uma repartição pública de utilidade duvidosa, ancorada numa coleção de livros e numa rotina restrita a emprestar livros para poucos leitores.
Atualmente, com o desenvolvimento da internet, a crise aumentou e as velhas e novas perguntas continuam sem respostas. O que pode existir, além da iniciativa municipal, é a política do Estado ou da União, ambas, no presente, extremamente conservadoras. A maioria segue o modelo do antigo INL – Instituto Nacional do Livro – criado no Estado Novo nos anos 40 do século passado, cuja missão essencial era distribuir livros. Hoje, com tantas voltas que o mundo deu, persiste-se nessa prática: “livros a mancheias”. E de tal forma que desconfio que esses projetos sejam mais de interesse das editoras e menos da população.
Em 1983 foi instituído em São Paulo o Sistema de Bibliotecas Públicas que, na época, trazia propostas novas, cuja base era a transformação das precárias bibliotecas municipais em centros de cultura, abrindo um amplo espaço para a “ação cultural”. Hoje, se for desenhado um projeto abrangente para a informação nas cidades, um novo modelo deverá ser criado. No entanto, não há notícias de trabalhos desenvolvidos por profissionais da informação para a área pública. Alguém conhece?
Como no caso da “biblioteca escolar”, a pública é ampla, a mais ampla das categorias, pois pode chegar à quase totalidade da população em 5.562 municípios. Esse imenso território foi abandonado por falta de políticas públicas de informação. E por que não existem essas políticas? Certamente, porque não interessa ter. A quase totalidade dos prefeitos não tem a menor idéia do que se trata – o que é previsível. Por outro lado, não se pode esperar da população que ela reivindique o que desconhece. E como reagimos nós que conhecemos muito bem o potencial da informação para a sociedade? Tradicionalmente, os profissionais da informação ficam à distância do poder público e, dificilmente, interferem em seu formato. Quando toco nesse assunto, os mais jovens reagem positivamente, mas os mais velhos olham com um ceticismo pétreo. Por que a descrença? Talvez considerem a informação pública como a antiga “biblioteca municipal” e acham que isso está mesmo superado, é um caso perdido e nada há para se colocar no lugar. Percebi, também, um pensamento tosco e perverso: o trabalho com esse público – leia-se: a população como um todo – é “simples”, “fácil” e não exige um desenvolvimento intelectual maior por parte do profissional. Esses modos de pensar, talvez, expliquem o distanciamento que existe entre os novos profissionais e a população. Certamente, alguém vai atribuir aos baixos salários na esfera pública a debandada geral. Mas baixo salário não é causa, mas conseqüência da falta de políticas públicas de informação.
Uma das tarefas que solicitava aos meus alunos era a seguinte: “Se um prefeito esclarecido de uma cidade de 30 mil habitantes pedisse a você para construir um serviço de informação pública que plano apresentaria?” É uma tarefa difícil, provocativa mesmo, e não só para os alunos, mas para quaisquer profissionais, inclusive para os “cientistas da informação”. Creio que as universidades públicas – onde se concentra, hoje, a maioria dos cursos de “biblioteconomia” e derivados – devem dar uma resposta, pois elas, pelo seu caráter público, têm compromissos com o público. Ou não? Será que estou delirando?

sexta-feira, 3 de abril de 2009

DEWEY & PIAGET

     Tempos atrás batizaram o programa governamental de apoio a bibliotecas públicas com um nome esquisito: “Fome de Livros”. A denominação me pareceu imprópria, mas, segundo me disseram, por desígnios políticos deveria ser mantida para fazer uma ponte com o “Fome Zero”. Ficou claro? Esperneei o quanto pude para que não fosse sacramentado o erro. Perdi e fiquei à distância. As pessoas não têm fome de livro como têm fome de comida. O que elas têm é a necessidade de leitura. Mas aí começa o drama, pois elas próprias não detectam essa necessidade. O que leva uma pessoa a ler? Obrigatoriedade e prazer. Leitura por obrigação é realizada em algumas ocasiões e com sofrimento; leitura por prazer persiste por toda vida e se faz por gosto. Como formar esse leitor? Como tornar a leitura gratificante? Não sei, mas me parece que esse gosto pela leitura se faz nos primeiros anos da alfabetização. Suponho que essa tarefa de motivar as crianças para a leitura seja do professor. Mas na prática, dificilmente isso ocorre, mesmo porque, de um modo geral, os professores não são muito chegados à leitura. Aí pergunto, baixando a voz: desenvolver o gosto pela leitura seria tarefa dos responsáveis pelas bibliotecas escolares?

     Supondo que existam bibliotecas escolares na maioria das escolas públicas brasileiras (o que não é verdade) e pessoas preparadas à frente delas (o que menos verdade ainda), vê-se que em torno do educando teríamos dois profissionais: o professor e o responsável pela biblioteca.   E aí vem a pergunta difícil: nessa triangulação professor/biblioteca/aluno quais são os papéis dos dois primeiros? Alguns acham que o professor estimula a leitura e o responsável pela biblioteca fornece o material que deve ser lido. Outros garantem que o professor vai ficar “dando a sua aula” e cabe à biblioteca criar um ambiente propício e ações apropriadas para que os alunos tomem gosto pela leitura. Se a primeira opinião for a correta, basta que a biblioteca seja um depósito bem organizado e o responsável por ele saiba localizar o que o professor pede para os seus alunos. No entanto, se a segunda opinião for a correta... aí tudo muda. O profissional da informação é formado para formar leitores? 

      O ensino básico no Brasil ainda se sustenta quase exclusivamente na aula oral e no giz.  Esse ensino reúne milhões de crianças, é a base da pirâmide que se não for sólida, desmorona. Portanto, é prioridade um para o desenvolvimento social.  Nós, profissionais do livro, da leitura, da informação, temos que dar uma resposta a essa demanda gigantesca e delicada, mas, ao que tudo indica, estamos distantes. Infelizmente, os bibliotecários e as entidades que os formam não interferem nas políticas públicas. O resultado dessa omissão histórica e de vários outros fatores é um ensino com leitura mínima.

      Aí surge uma questão incômoda: as instituições de ensino superior que formam profissionais da informação, de alguma maneira, estão voltadas para a reflexão e formação de profissionais para encarar essa tragédia? Ou será que os escolares, enquanto público, estão excluídos de nossas preocupações? Vejo – e gostaria que me provassem o contrário – a informação para escolares e a informação pública em baixa, a caminho da extinção. A Biblioteconomia secular não prepara pessoas para trabalhar com esse público complexo. E muito menos se preocupam com ele as instituições que buscam formar “cientistas da informação”. Para os primeiros diria que trabalhar com o público infanto-juvenil pede menos vale Dewey e mais pesa Piaget. Para os segundos, não sei o que esperar, talvez um Paulo Freire temperado com epistemologia?

Nessa altura, tenho uma certeza: não há uma “informação”. Mas múltiplas. E bem diferenciadas. O que faria um genérico “cientista da informação” numa escola periférica? Talvez um novo profissional deva ser criado entre a educação e a informação, um infoeducador. Ele, dentro de novas políticas sócio-educacionais, talvez tivesse novas perspectivas de trabalho e um papel social mais relevante. 

quarta-feira, 1 de abril de 2009

INFORMAÇÃO PRÁ QUE?

É preciso deixar bem claro: desde a minha mais tenra infância bibliotecária penso a Informação, primeiramente, a partir de quem a recebe. Ainda estudante criei algumas confusões quando disse que na Biblioteconomia a preocupação quase solitária era “como fazer” e eu achava que antes de pensar no “como” era necessário dar resposta a uma pergunta muito simples: “por que fazer?”. Em outras palavras, na opinião corrente da época, eu estava infestando com filosofices as regras de catalogação. No entanto, acreditava que ao dar resposta a essa pergunta estava olhando para as pessoas e me colocando no lugar do receptor. E vinha o desafio: conhecer o meu público; e ao tentar fazê-lo pedia socorro a outras áreas do conhecimento: sociologia, antropologia, história e, vá lá, filosofia. Interessava-me muito um campo muito tênue nos currículos: “estudo do usuário”. Aliás, “usuário” é o que usa; quem não usa e devia usar é o “público”.
Hoje me parece óbvio que é fundamental ao criar um serviço de informação saber a quem vou servir e o que pretendo com o meu trabalho. Na época isso não era relevante e tudo se concentrava nas “disciplinas técnicas” que existiam em sua aridez como fim e não como meio. Em algum texto publicado nesse tempo fiz uma frase um tanto maldosa: a área de conhecimento do bibliotecário mede 7 e meio por 12 e meio. Eu apenas estava me defendendo da imposição que me fazia reter quilômetros de regras sem saber o que fazer com elas. Pode, hoje, parecer ingênuo, mas na época me entendia como o médico que examinava o paciente, conversava com ele, pedia alguns exames clínicos para fazer um diagnóstico. Só depois de conhecê-lo muito bem prescrevia a medicação. Como regra, não criava medicamentos. Quem fazia isso eram os farmacólogos, os químicos... Apenas conhecia as bulas e utilizava os medicamentos da melhor forma possível em busca do bem-estar das pessoas. Às vezes não havia medicação adequada e nada me impedia de inventá-las. O papel essencial do bibliotecário era, conhecendo muito bem o seu público, torná-lo usuário dos serviços oferecidos. Dentro do meu modo de ver (método) continuo olhando, antes das técnicas, o público que escolhi.
No próximo post vou tentar ver o que acontece com a Informação aplicada a um público que deveria, como meta do País, ser preferencial e que, no entanto, é menosprezado, vilipendiado, maltratado: os escolares.